quinta-feira, 17 de março de 2011

Japão: Um choro contido

Uma das coisas mais difíceis e ao mesmo tempo mais apaixonantes e determinantes na vida missionária é o desafio da inculturação: Penetrar na cultura de outro povo. Mais! Fazer tua própria a cultura do outro. Só assim a evangelização se torna eficaz.

Como padre missionário, pensei nisto nestes dias em que os olhos do mundo se voltam para o Japão. Primeiro o terramoto, depois o tsunami e agora a crise nuclear.
 
Diante de tamanha tragédia e da forma como aquele povo está a viver tudo isso, surgem-me questionamentos. E a maior descoberta é a de ver quão diferente é aquela cultura da minha, ocidental, latina em particular.

Todo o acontecimento é fonte de novos conhecimentos. Com as tragédias também aprendemos coisas com os povos que as vivem. Hoje li que, ao contrário de outros povos, em situações semelhantes, o povo japonês não tem por hábito chorar. Os japoneses calam as suas emoções negativas por uma razão: uma espécie de pudor, internalizado, que procura não ofender a quem os rodeia. Como se a própria dor pudesse importunar ou aumentar a dor do outro. E a cultura japonesa baseia-se no respeito pelo próximo e no bom funcionamento do grupo.

Há explicações: A cultura japonesa é uma cultura baseada numa mitologia que censura, digamos assim, os comportamentos negativos e premeia os comportamentos positivos. As acções individualistas e anti-sociais são condenadas. Dar voz à dor, ao choro desgarrado implicaria carregar de energia negativa a quem os rodeia. Talvez por isso e ao contrário, por exemplo, do que víamos em 2004 no pós Tsunami da Indonésia ou, em 2010, no Haiti, nos seja tão difícil vermos imagens de mortos desta tragédia ou mesmo de pessoas a chorar.

Para mim, que sou de lágrima algo fácil, faz-me espécie tanta contenção de emoções e sentimentos perante situações de dor e tristeza. Não tenho dúvidas que esse sofrimento não deixa de estar lá, bem dentro de cada japonês, como em cada um de nós. Apenas se exprime de formas radicalmente diferentes. Sofrem e choram por dentro. Um desafio para a inculturação!

Albino Brás

2 comentários:

  1. Se assim é pobres Japoneses que a sua cultura não os deixa chorar. A psicologia diz-nos que a única forma de nos desenvencilharmos das emoções negativas causadas por um trauma um desastre ou uma tragedia é chorar.

    Devemos chorar tudo o que perdemos; o luto que em português tem mais que ver com o vestir, é um processo importante para a saúde mental e espiritual; em inglês há duas palavras para ilustrar o conceito: mourn e grieve que tem que ver com um processo mais ou menos demorado.

    Na Etiópia as pessoas que estão de luto ficam inactivas sentadas por dias enquanto são consoladas pelos familiares que vêm de longe durante um mês depois do funeral. Acho isso bem mais saudável psicologicamente que a cultura japonesa.

    As emoções reprimidas são daninhas para a saúde porque acabam por expressar-se de uma forma solapada da qual a pessoa não é consciente; tanto podem fazer a pessoa mais agressiva como mergulha-la na depressão. Que somos um ser social fica provado pelo facto de que a tristeza diminui quando partilhada e a alegria aumenta.

    P. Jorge Amaro, IMC

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  2. A beleza e a cultura do japão reflete a força que eles possuem, mesmo não sendo eles cristão de alguma forma o amor de Deus que é universal os move, por isto eles sempre conseguiram superar as tragédias e desta vez não será diferente.
    abraços

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