quinta-feira, 28 de outubro de 2010

A crise I

Trata-se de um tema imensamente complexo, tanto que nem os economistas (supostamente os informados sobre o assunto) concordam uns com os outros. Basta reparar que tanto Francisco Louçã como Cavaco Silva são economistas e professores catedráticos de Economia, embora tenham posições políticas tão diversas em matérias económicas.
A crise mais actual é chamada “da dívida soberana”, o que é dizer, da dívida pública dos Estados. Para a compreender começo por definir alguns conceitos importantes para desenvolver a questão. Assim, é importante saber o que é exactamente o tão badalado défice (das contas públicas), que é, nada mais nada menos que a diferença entre as receitas e as despesas do Estado. Este défice é normalmente definido em percentagem do Produto Interno Bruto (PIB), pelo que também é necessário sabermos o que é o PIB. O PIB é exactamente tudo o que é produzido num determinado país ao longo de um ano, pelos residentes nesse país, sejam eles nacionais ou estrangeiros. O défice mede-se em percentagem do PIB porque o seu valor nominal (monetário) não permite comparações entre os países. Um país grande e com um grande PIB tem obviamente um défice em termos nominais muito superior a um pequeno país.
Outro conceito importante é a dívida pública. A dívida pública é apenas e só, a soma de todos os défices ao longo de todos os anos, ou seja, o total que o Estado deve.
Existe ainda outro défice, o chamado défice da balança de transacções correntes, que é, grosso modo, a diferença entre as importações e as exportações. Existe ainda outra dívida, que é a dívida externa, que é a divida total, pública e privada, de um país ao exterior.
Também é importante termos consciência das contas do Estado. O Estado financia-se principalmente através de impostos e gasta o dinheiro em investimentos públicos, por exemplo as auto-estradas, em salários ao sector público e também em grande medida, no pagamento dos juros da dívida pública.
Ora, o nosso problema é este: o défice das contas públicas e a dívida pública portuguesa cresceram imenso ao longo dos últimos anos, atingindo níveis que, para muitos economistas, nos levam a estar perto da rotura. Porquê? Porque o Estado, para se financiar, precisa de ir aos mercados financeiros, a instituições parecidas com bancos e pedir empréstimos. Estas instituições, exactamente como a nós, quando pedimos um crédito a um banco, analisam o Estado português e chegam à conclusão que existe cada vez maior risco de este não cumprir com as suas obrigações, ou seja, de não pagar o que deve. Assim, para compensar o risco, as tais instituições financeiras aumentam os juros que pedem ao Estado português para lhe emprestarem dinheiro. Acontece que quanto mais os juros aumentarem, maior a probabilidade de o Estado entrar em bancarrota.
O nosso problema é este então. A solução apontada é: temos de reduzir o défice ao máximo e ver se, assim, a dívida pública também deixa de aumentar tanto. Para reduzir o défice, o caminho mais simples é, reduzir os gastos com salários dentro do sector público e aumentar impostos com o intuito de aumentar as receitas.
Muitos economistas argumentam que, sem estas medidas, os mercados financeiros deixam de confiar na nossa dívida e deixam de emprestar dinheiro. Se eles não emprestarem dinheiro o nosso Estado deixa de conseguir pagar os salários à função pública, deixa de pagar os serviços que as empresas lhe prestam e, em último recurso, aparece um novo jogador, o FMI. O que o FMI faz é emprestar dinheiro aos Estados em dificuldades a juros mais baixos e assim garantir o financiamento desses Estados. Mas esta ajuda no FMI não é grátis – obriga a um compromisso sério dos Estados para a consolidação das contas públicas, reduções ainda maiores dos salários, aumentos ainda maiores dos impostos, etc…
Por tudo isto é que ouvimos dizer todos os dias na TV que, apesar de ser mau, o Orçamento de Estado tem de ser aprovado, porque se não for aprovado, corremos o risco de os juros da dívida pública crescerem ainda mais e entrarmos então em bancarrota. Somos obrigados a unir-nos a esse desígnio que é a austeridade para bem do país.
Continua...
Tiago Santos

2 comentários:

  1. "apesar de ser mau, o Orçamento de Estado tem de ser aprovado"

    Dúvida: ao ser aprovado o Orçamento de Estado, é garantido que não entramos em bancarrota?

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  2. "Dúvida: ao ser aprovado o Orçamento de Estado, é garantido que não entramos em bancarrota?"

    Não sou a melhor pessoa para te responder, por isso fica apenas a minha opinião pessoal:
    Não é garantido que o país não caia na bancarrota, mas é garantido que a maior parte dos portugueses o façam :(

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