segunda-feira, 19 de março de 2012

Desemprego: esmagamento das vocações


O desemprego e todas as alterações que se vão verificando nas leis laborais têm alterado por completo a maneira como nos colocamos perante o trabalho. Este, na complexidade da existência humana, esteve sempre ligado a uma realização pessoal, a uma aspiração interior que envolve o sujeito naquilo que de mais profundo existe em si. O modo como os outros nos olham e a maneira como nos envolvemos socialmente depende em grande medida daquilo que fazemos e das tarefas que realizamos. Vivemos toda a vida por causa do trabalho. Para o fazer o melhor possível. Para sermos dignos da existência. O compromisso que criamos e nos liga aos outros gera-se em função daquilo que fazemos. É nos completamente impossível estar na vida sem a resposta à pergunta fundamental: O que é que eu vou fazer? O que é que faço da minha vida?


O trabalho dá-nos a resposta. Aquilo que eu sou só é percetível em função daquilo que faço. O desenvolvimento das qualidades humanas (a coragem, a inteligência, a bondade, a fidelidade, a integralidade) só se realiza porque somos seres em construção a partir do trabalho. Existe uma vinculação estreita entre mim e aquilo que faço. Quando as pessoas se conhecem uma das primeiras perguntas que fazem não é esta: O que é que fazes? O desemprego vai estourar por completo com esta dinâmica. Rebenta completamente com os alicerces a partir do qual se forma a nossa existência. Fomos e somos criados em função de um ideal: fazermos o melhor possível para nos realizarmos humanamente. E isso só se consolida na realização efetiva do trabalho. O que resta do Homem quando isto não é assegurado? O que nos fica quando não é possível gerar os meios que nos darão uma resposta aos nossos ideais? Para que serve a escola se o desemprego é o futuro? Para que servem as aprendizagens sociais se estas se tornaram obsoletas e já não servem?

Na vida todos queremos ser alguma coisa: professores, engenheiros, missionários, serralheiros, bombeiros. Lutamos afincadamente por isso. Não viramos a cara à luta e toda a vida é feita a partir dessa construção. Dedicamos o melhor esforço a essa realização. Somos seres vocacionados. Somos empreendedores de uma existência cujo significado é infinitamente superior aos sacrifícios. Quanta disponibilidade não existe no nosso trabalho? O maior drama é o esmagamento do ser vocacional. Quando as minhas qualidades e o que tenho de melhor não é reproduzível socialmente, a existência torna-se um pesadelo. A alegria da vida é sermos seres vocacionados a quem a sociedade lhe dá uma possibilidade de realização. É este o papel das sociedades abertas e democráticas: dar condições para que os indivíduos se realizem. Oferecer horizontes em que as vocações se amplifiquem. A estrutura do ser humano na sua vocacionalidade nunca pode ser interrompida.

Quando o trabalho deixa de ser uma expectativa, a sociedade muda. O pilar da sociedade europeia contemporânea é a realização pelo trabalho. Todos crescemos assim. Quando ele escasseia ou é bruscamente interrompido abrem-se brechas profundas que podem ser insanáveis. Múltiplos discursos de diferentes quadrantes referem-se ao risco de na Europa com a atual crise poder existir a breve prazo uma implosão social. A sua raiz está aqui: já não é possível dar às pessoas aquilo para que se sentem vocacionadas. Esta é a tragédia!
Jorge Almeida in Fátima Missionária

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