terça-feira, 20 de março de 2012

Sem medo de (se dar a) conhecer

Todos somos um ser em relação, dizem-nos os filósofos, os psicólogos, o próprio mundo em que vivemos, porém, cada vez temos mais receio em abrir-nos ao outro talvez com medo de que esse outro possa fazer-nos mal ou apenas porque estamos bem assim e ponto final.

Porém esquecemo-nos que a relação não é apenas dar algo de nós a alguém; é também receber algo desse outro e esse algo faz de nós algo maior... não tenhamos receio de, no nosso dia a dia, sermos como:

Queria a todo o custo ver o mar. Era uma boneca de sal, mas não sabia o que era o mar. Um dia decidiu partir. Era a única maneira de satisfazer a sua exigência.

Depois de uma interminável peregrinação através dos territórios áridos e desolados, chegou à beira-mar e descobriu qualquer coisa de imenso, fascinante e misterioso ao mesmo tempo. Era a aurora, o sol começava a brilhar sobre a água acendendo tímidos reflexos e a boneca não conseguia compreender.

Ficou ali durante muito tempo, de pé e de boca aberta, diante dela aquela imensidão sedutora. A um certo momento, decidiu perguntar ao mar:
- Diz-me, quem és tu?
- Sou o mar.
- E o que é o mar?
- Sou eu!
- Não consigo compreender, mas gostaria tanto! Explica-me o que devo fazer?
- É simples: toca-me.

Então a boneca encheu-se de coragem. Deu um passo e avançou em direcção à água. Depois de algumas hesitações, pisou aquela massa com um pé. Sentiu uma estranha sensação. Tinha a impressão que começava a compreender alguma coisa.

Quando retirou a perna, reparou que os dedos dos pés tinham desaparecido. Ficou assustada e protestou:
- Maroto! O que tu me fizeste! Onde estão os meus dedos?

Imperturbável, replicou o mar:
- Porque é que te lamentas? Simplesmente ofereceste alguma coisa para poderes compreender. Não era o que tu querias?...
- Sim... é verdade, mas não pensava... mas...

Parou um pouco a reflectir. Depois avançou decididamente para a água. E esta, progressivamente, a cobria e lhe tirava qualquer coisa, dolorosamente.

A cada passo que dava, a boneca de sal perdia algum pedaço. Quanto mais avançava, e se sentia privada de uma parte de si, mais tinha a sensação de compreender melhor. Mas ainda não conseguia dizer o que era o mar.
Fez outra vez a costumada pergunta:
- O que é o mar?

Uma última onda submergiu o que restava dela. E precisamente naquele momento em que desaparecia, perdida na onda que a cobria e a levava não se sabe para onde, a boneca exclamou:
- Sou eu!

Lenda budista

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